A época áurea do "Ancien Régime" (Antigo
Regime) constitui o período que vai aproximadamente do século XV ao XVIII,
quando floresceram as monarquias na Europa e do qual tivemos apenas um apagado
finalzinho com a vinda da família real portuguesa para o Brasil em 1808.
O apogeu desse Regime se processou principalmente com o
fausto dos salões nos palácios da França, e graças a um componente especial que
foi a Corte, com sua estrutura de funcionamento em que sobressaíam as regras de
etiqueta e os princípios de honra.
A Corte – um espaço hoje inexistente – juntava o público
e o privado em torno do rei, sua família e os senhores de maior poder. Seu
aprimoramento ‘coincide’ com o fim do feudalismo e prenuncia o Estado moderno
fortalecido pelo poder real concentrado.
Foi só depois de muitas lutas, mudanças territoriais,
deposições, casamentos por interesse e assassinatos é que surgiram as
monarquias europeias, oriundas da junção de pequenos reinos. Nesse ambiente
cortesão, nasceu então a necessidade da existência de um conjunto de regras e
princípios que se pode chamar de etiqueta, uma espécie de ritual que regulava a
vida na Corte.
Desse modo, a “busca de uma vida bela” e luxuosa
constituiu o objetivo de um dos primeiros e maiores reinos – o do duque de
Borgonha –, em torno do qual desfilava a nobreza da Corte. Saídos da lida dura
das guerras, esses nobres passaram a uma vida ‘difícil’ porque sedentária, e
precisavam dominar a sua violência aprendida e desenvolvida nas contínuas
guerras. A etiqueta apareceu então como uma necessidade social para refrear os
impulsos, enfatizar sentimentos e facilitar o convívio.
Interessantes informações como essas estão no pequeno
volume "A etiqueta no Antigo Regime", de Renato Janine Ribeiro
(Editora Moderna, 63 páginas), do qual extraímos algumas curiosidades.
O capítulo intitulado “As boas maneiras” conta que no
século XI uma princesa de Bizâncio casou-se com o Doge de Gênova e trouxe em
sua bagagem um garfo, pois sabia que na Europa este instrumento era
desconhecido. No Ocidente só se usava a faca com que os homens cortavam carne,
palitavam os dentes ou portavam como arma. A princesa oriental com o seu garfo
escandalizou a Corte, sendo até acusada por um sacerdote de ímpia,
provavelmente devido às semelhanças do instrumento com o tridente do diabo.
Naquela época, o Oriente era mais civilizado que o
Ocidente, que só começou a manejar os talheres com o Renascimento, a partir do
século XV.
Assim como o garfo, o uso do lenço foi outra prática que
se iniciou na Renascença, e só se tornou mais difundida na época de Luís XIV, o
rei-sol. Ensinava-se aos nobres que deviam usar sempre o lenço, lembrando que
os camponeses assoavam o nariz no boné ou na roupa. O autor cita Giovanni della
Casa: “Tu não deves, depois de te assoares, abrir o lenço e olhar o que este
contém, como se pérolas ou rubis te houvessem descido do cérebro pelo nariz”.
A palavra etiqueta quer dizer “rótulo”, mas
originariamente significava um “escrito num saco de processo”, para
identificar, nos tribunais, os documentos de um processo. Depois passou a
significar qualquer papel colocado em um objeto para indicar a sua natureza. Só
mais tarde, no “Ancien Régime”, teve a acepção de conjunto de normas de
comportamento.
Na França, a rainha Maria Antonieta ficou célebre por uma
reverência com a cabeça e um olhar especial para colocar os nobres em seus
devidos lugares como forma de etiqueta. Portanto, a etiqueta fazia parte do
jogo social, por estabelecer hierarquias, normas e atitudes.
Com a Revolução Francesa, no final do Oitocentos, e a
consequente subida da burguesia ao poder, a etiqueta, como comportamento leve e
natural, desapareceu e com ela a vida prazerosa no Antigo Regime, passando a
ser posteriormente e cada vez mais apenas um instrumento de competição de
classes e de ascensão social.
obrigado útil d+
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